segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Amor Tricolor!!!

(por Jaqueline Santana)

Às vezes, lendo os textos postados aqui no Bahêa Minha Porra, fico lembrando das histórias que vivi ao torcer por esse time: viagem de 2 dias em ônibus ruim pra ver o time em Fortaleza, copo de cerveja na cara e escolta da polícia em Recife (1988), faltar a encontro com namorado para viajar pra Feira de Santana domingo de tarde… aff… A maior responsabilidade nisso é de meu pai: o véi Vavá.
 O véi Vavá nasceu em 1927, quatro anos antes do Bahêa, em Santo Amaro da Purificação, e veio morar em Soterópolis logo em seguida. Virou Bahêa assim que o time foi fundado e comparecia, religiosamente, a todos os jogos… No campo da Graça, na Fonte Nova e em todos os lugares mais, até no Barralixo…
 Ele só vestia roupa azul, vermelha e branca, sendo que qualquer outra cor soava como traição. Foi sócio fundador do time… Pai de 7 filhos, pensava que sacrificar seu salário de operário da ferrovia para ajudar a manter uma das suas alegrias de vida era obrigação.
Eu sou a filha caçula, nascida após a aposentadoria. Por isso, virei sua companhia no estádio. Ralei muito joelho na arquibancada, correndo e brincando quando criança, não prestava atenção ainda no jogo e ia junto porque meus irmãos não podiam ou não queriam ir mais com ele, velho e marrento… Anos depois, adolescente, habituada e viciada igualmente no time, virei sua companhia de choro e aprendi a roer as unhas pelo time.
O tempo passou, eu cresci e deixei de ir ao estádio… Mas o véi Vavá não. Continuou a sair todo domingo, com seu radinho, sua garrafa térmica e sua almofada. Quando descobriu que tinha o direito, ganhou seu passe livre pra entrar no estádio, e esse foi uma de suas maiores alegrias. Parecia um menino ouvindo seu time jogar. Sempre com os comentários de Armando Oliveira, seu ídolo, na ponta da língua.
Nesse período, passou a levar consigo também seus remédios pra asma. Sempre com seu Hamilton, companheiro de torcida. Levava também qualquer um que pudesse acompanhá-lo, inclusive um primo meu, torcedor do Lixória… Sua esperança era catequizar o cara… Tadinho… Não adiantou, o bichinho tem mau gosto mesmo…
O véi Vavá era tão viciado no Bahêa que seu humor variava conforme o resultado dos jogos. Uma das primeiras coisas que aprendi foi dormir cedo nas quartas-feiras quando o Bahêa empatava ou perdia na Fonte… Quando ele chegava, num tinha papo, quem tivesse pela frente, sobrava!!!!
Eu respeitava tanto isso nele que, mesmo após a idade adulta, nunca arrumava namorado que não fosse tricolor, porque seria o mesmo que me condenar à segregação familiar. O mesmo aconteceu com o nome da minha filha, cuja escolha teve participação do véi Vavá: eu queria que a guria fosse minha xará. Cheguei a revelar minha vontade em batizá-la de Maria Vitória, para combinar com meu nome, que significa “o vencedor”, em hebraico. O véi Vavá disse: “Se botar esse nome, deserdo!!!” Então, a guria virou Daniela, cujo significado é: “Deus é meu juiz”… E ganhou padrão completo do Baêa, antes mesmo de nascer, pra aprender cedo.
Mas o tempo passou também pro véi Vavá. Em 2002, voltando da rua num domingo, por volta das 14 horas, encontrei-o parado, a uns 200 metros de casa, amparado num poste, arfando. Não conseguiu chegar ao ponto de ônibus para encontrar os amigos. O sentimento de humilhação que vi em seus olhos ao ser amparado por mim, no retorno à casa, foi indescritível. Esse foi o sinal de que estava acabando sua jornada na Terra: não vê-lo conseguir chegar a um jogo do Baêa era um marco, nunca antes visto. Chorei escondida… E ele também.
Mas ele viveu mais um ano ainda: o suficiente para ver muitas vezes, pela parabólica, os jogos. Seis meses após sua partida, aconteceu a tragédia: o Bahêa caiu pra segunda divisão, naquele 7 X 0 contra o Cruzeiro. Eu, ouvindo o rádio, na rua, liguei pro meu marido, que estava em casa e disse, chorando: “Se meu pai não tivesse morrido, morreria hoje!!!”
O véi Vavá se foi. Mas seu amor pelo Bahêa vive ainda, em mim, em meus irmãos e em nossos filhos. Ele não tinha herança financeira pra deixar, mas ensinou a todos nós, desde criança, um grito, um desabafo, que nada mais é do que a declaração de amor por essa religião que a gente chama de time. BORA BAHÊA, MINHA PORRRRRAAAA!!!

Valeu, véi Vavá, fica com Deus!!!

Jaqueline Santana


Texto , enviado pela amiga Jaqueline  Santana ao  site "Bora Baêêêaa Minha Porrraa!!!.

Publicação autorizada pela  autora.

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